confissões de um ‘teólogo cansado’

Eu não estou bem certo de que escrever as confissões de um ‘teólogo cansado’ será de alguma utilidade para alguém e muito menos seguro de que é correto fazê-lo. Mas o farei, pois poderá ser que alguém também se identifique.

Eu estou cansado de ser teólogo. Eu li bastante a Bíblia nesses anos de convertido, e não digo isso para orgulho, e isso me fez ‘azedo’ quando notei, na minha denominação, que pessoas que a liam menos que eu eram mais descolados.  Eu era bastante solicitado para orar, para pregar, para viajar, principalmente quando se precisava de alguém ‘de Deus’, um ‘bom conhecedor da Palavra e que tenha intimidade com o Pai’. Confesso, minhas interações eram bem pequenas, dado que o assunto que eu sabia bem era o assunto das Escrituras e quase ninguém sabia ‘desenrolar’ comigo o assunto. Por essa razão fui arrastado para a pregação leiga.


Eu estou cansado de ser teólogo. Chegou um momento na mocidade da igreja em que os homens começaram a orar a Deus por namoradas e eu não agi diferente; o problema comigo era que eu não tinha a ‘manha’ do mundo, eu cresci na igreja (me converti com 11 anos e batizei com 12) e então vi meus colegas arrumarem namoradas e eu não. Quando então eu alcancei uma namorada, dado os meus erros, ela fez o que achava certo que foi ter uma espécie de relacionamento com um cara que, para mim, era uma ‘pedra no sapato’ (bom, espero que ele e ela não leiam isso! Hehe). E esse ser ‘trocado’ me fez ter uma caricatura divina (que eu estou lidando até hoje, cinco anos depois). Deus deixou de ser o Pai amoroso e se tornou o Deus cruel. Na linguagem de Lutero, deixou de ser o Deus revelado e passou a ser o Deus oculto (Deum absconditus) e até hoje quando as coisas dão erradas para mim, eu tenho esse sentimento de ‘Deus cruel’, afinal de contas, ele não determina tudo segundo a sua vontade? (Efésios 1:11) e eu não consigo ver como isso vai cooperar juntamente para o meu bem (Romanos 8:28).

Não bastasse estar cansado de ser teólogo, estou cansado da igreja. Não sou desigrejado. Amo a noiva de Cristo. O problema é que quando eu pensei: ‘dessa vez vai’, apareceram fofoqueiros na igreja que falaram coisas de mim e de uma moça que eu realmente apreciava que me fez querer distanciar o máximo possível de qualquer contato com a igreja por um tempo. Contudo, eu tenho no coração o lema da cristandade: “A igreja é a tua mãe, ela te gera e nutre pela Palavra” (Lutero). “Não se pode ter Deus como Pai se não tiver a Igreja como mãe” (Cipriano de Cartago). E aos poucos estou retornando à comunhão com os santos como dantes.


Nesse ínterim, me apaixonei por uma amiga. Já tinha sofrido com a perda da primeira namorada e com a difamação a respeito da segunda moça. E agora, surge diante de mim uma terceira moça, muito linda por sinal. O que era para ser uma convivência de meio ano se tornou convivência de mais tempo. O problema, para mim, era que gostando dela eu a aconselhava amorosamente para se declarar para o cara que ela gostava e isso se repetiu mais uma vez, recentemente (na verdade, semana passada aconteceu esse segundo incidente. Espero que ela não leia também hehe).  O fato é que mais uma vez eu quebrei a cara, e conversando com ela sobre isso, ela sente o mesmo que eu nesses assuntos. Se eu fosse Lutero, gostaria que ela fosse minha ‘querida Kate’.

Com isso tudo acontecendo e sendo deficiente físico (eu tenho Paralisia Cerebral, mas só encurtou os tendões das pernas e que se lasque o termo ‘especial’), eu me indago sempre o porquê das coisas a Deus. Com as muitas leituras bíblicas, eu sempre esperei uma resposta miraculosa de Deus que nunca veio e descobri depois por que. Simplesmente por ter cessado esse meio e hoje ele age por providência. E essa ausência de resposta miraculosa me levou à depressão espiritual. Foi bom para mim, como diria o salmista. Eu era intolerante e achava depressivos ‘menos espirituais’. Achava até passar por isso também. Essa depressão me fez buscar uma teologia mais sólida e aí conheci o que é comumente chamado de ‘Calvinismo’. Problema à vista. A referida igreja é arminiana, neopentecostal e arroga ter apóstolos. Distanciei das pregações, por conflito doutrinário, não que eu fui expulso, foi uma decisão minha mesmo. Nesse intervalo, tenho feito seminário, coloquei a estudar a história da igreja (e por sinal eu estou me graduando em história). Me fascinei por Lutero, afinal, ele sofria de depressão (quem diria hein, Lutero?) e dá-lhe Lutero. (até hoje tenho influências luteranas, inclusive, encomendei mais um livro da Sinodal, ontem 29/08).

Com esse prospecto em mente, você me encontra hoje. Cansado de tentar crer. Ciente de que a fé é dom de Deus (Efésios 2:8-9). E como Lutero diz uma resposta do coração crente à voz vivificante de Deus. Mas agora, estou ciente de que não preciso disfarçar para Deus como eu pensava antes, eu lembrei que ele sabe tudo, antes que a palavra me chegue à boca (Salmo 139). Ciente de que a minha fé é menor que eu julgava. Como C. S. Lewis dizia que Deus já conhecia a espécie de minha fé era eu que não a conhecia. Ora, ele não é o autor da fé (Hebreus 12:2)? Como ele poderia não saber do tamanho dela? Hoje, uma oração mais apreciada por mim na Escritura é do pai do menino lunático: “Ajuda-me na minha incredulidade” (Marcos 9:24).

Se você me encontrar e perguntar: “Crês que Deus pode fazer algo na sua vida amorosa?” Responderei: “Não sei se ele o quer fazer”. Poder ele pode. Querer é outra coisa, não é? Isso me levou à uma fraca concepção de orações respondidas. Eu estou lutando para crer que ele responde orações, afinal, as Escrituras dizem que sim e as Escrituras não podem falhar (João 10:34-35).

À essa altura, você deve estar se perguntando, se eu não estou em crise. Respondo que não. Porque agora eu conheço melhor as minhas fragilidades e entendo que “aquele que começou a boa obra é o mesmo que terminá-la-á. (Filipenses 1:6). Ele me deu fé quando não tinha, me reconciliou quando inimigo (Romanos 5:8-11), me adotou quando estranho (Efésios 2:11-19).  Bom, ele é fiel e ele fará (1Tessalonicenses 5:24). Confio nele que o mesmo que me deu a fé, nutri-la-á.  Sou teólogo e não deixarei de sê-lo. Fui chamado por Deus e ele me susterá.  Há muito que se admirar na persistência de irmãos em situações como essas e no Salvador que nos cuida. Ele é o mesmo. Ele sustentou Moisés, Elias, Davi, Lutero, Spurgeon, sustenta a mim e a você. 


Se você leu até aqui e se identifica, deixe um comentário para que eu saiba. E o meu conselho para você: Insista! “Eia” como diria Josué e Calebe. “Há mais sete mil” como diria Elias. “Esses sofrimentos (idênticos) estão se cumprindo na Igreja ao redor do planeta”, diria Pedro (1Pedro 5:9). Não estamos sós na jornada. Charles Spurgeon tinha uma ideia que vale mencionar aqui. O caminhar cristão não é uma vacinação única que nos deixa imune, mas um acompanhamento terapêutico constante com o médico. Ele nos prometeu: “Nunca o deixarei e nunca o abandonarei”. “Estarei convosco até a consumação dos séculos” (Mateus 28:20; Hebreus 13:5).
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PS 01: Se algum de vocês for algum dos indivíduos mencionados aqui, saiba que eu os amo.
PS 02: Não estou escrevendo para ser imitado. Afinal, outra coisa que cansa é ouvir que não se pode fazer isso ou aquilo porque somos modelos. Estou escrevendo por ter vontade. Se quer fazer o mesmo faça, mas assuma a ideia e não diga que foi induzido por mim.
PS 03: Se você abandonou a Igreja, volte para ela. Já foi dito que ela é como a arca de Noé e que se não fosse as aguas lá fora, ninguém suportaria o fedor de dentro. Não existe a ideia de cristianismo solitário antes do século 20. Paulo disse: “Somos corpo de Cristo e individualmente membros desse corpo” (1Coríntios 12:27).  


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