Graça
O apóstolo Paulo escreveu:
— "Quanto a você, permaneça naquilo que aprendeu e em que acredita firmemente, sabendo de quem você o aprendeu e que, desde a infância, você conhece as sagradas letras, que podem torná-lo sábio para a salvação pela fé em Cristo Jesus. Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a educação na justiça, a fim de que o servo de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda a boa obra"1.
Permanecer no que aprendemos e no que acreditamos é o maior desafio. Esquecemos com uma facilidade enorme de coisas simples e essenciais na nossa vida. A correria, a cobrança, o excesso de informação, tudo contribui para que nos esqueçamos das coisas que realmente importam. Não é à toa que a Bíblia, no livro de Deuteronômio, tem oito ocasiões nas quais o povo de Israel é encorajado a se lembrar dos feitos de Deus; e no livro de Josué tem, pelo menos, quatro memoriais para instigar a memória de Israel; e, finalmente, a segunda epístola de Pedro foi escrita para despertar à memória dos cristãos sobre coisas que eles já sabiam2.
Eu quero falar agora de algo extremamente salutar na nossa vivência com Deus. Algo que não podemos e nem devemos deixar passar batido na nossa vida de jeito nenhum. Algo que se permanece ou cai faz toda a diferença no mundo. Eu quero falar da Graça.
A Bíblia fala muitíssimo sobre a Graça; do início ao fim. Os apóstolos desejavam às pessoas a graça, pois eram o melhor que tinham a desejar. Era o melhor que haviam recebido de Deus. Embora fale muito sobre a Graça, a Bíblia não se esforça para conceituá-la no sentido estrito do termo conceituação. Isso fica como tarefa para os teólogos. Apela-se para o termo no idioma grego e daí faz uma conceituação. Mas hoje eu quero deixar de lado toda a conceituação oriunda da terminologia grega do Novo Testamento. Quero ater-me à definição dada por Philip Yancey em seu livro “Maravilhosa Graça” (p. 64):
“Graça significa que não há nada que possamos fazer para Deus nos amar mais — nenhuma quantidade de renúncia, nenhuma quantidade de conhecimento recebido em seminários e faculdades de teologia, nenhuma quantidade de cruzadas em benefício de causas justas. E a graça significa que não há nada que possamos fazer para Deus nos amar menos — nenhuma quantidade de racismo ou orgulho, pornografia ou adultério, ou até mesmo homicídio. A graça significa que Deus já nos ama tanto quanto é possível um Deus infinito nos amar”.
A graça é a peculiaridade do cristianismo, segundo explica C. S. Lewis. O que torna o cristianismo distinto de toda religião é sua ênfase na Graça3. É a graça de Deus que coloca em movimento a salvação humana. Paulo disse: — “Pela Graça vocês são salvos e isso não vem de vocês; é dom de Deus4”.
A graça de Deus nos aceita com nossas imperfeições, mas nos transforma ao ponto de nos deixar sem elas. A Bíblia chama isso de “viver piedosamente”. Isso nada mais é do que negar nossas paixões5.
Nestes dias, é necessário ressaltar profundamente que nenhuma quantidade de renúncia ou conhecimento fará Deus nos amar mais do que já ama. Clemente Romano, Pai da Igreja, já dizia: “Não podemos justificar-nos a nós mesmos. Não por nossa sabedoria, nem entendimento, nem piedade, nem nossas obras nascidas da santidade do coração. Senão pela fé por meio da qual o Deus Todo poderoso justificou a todos os homens desde o princípio6.” Não é pela quantidade de livros, de leituras, de diplomas, de faculdades; não é pela quantidade de vigílias, jejuns, orações, meditações, leituras bíblicas, decorebas teológicos e nem pela quantidade de evangelismos que fazemos. Somos salvos apenas e tão somente pelo movimento da graça.
Tudo isso acima é importante e tem seu lugar e valor. É preciso que um crente regenerado por Deus leia a Bíblia, ore, jejue e evangelize, sim. Mas transformar isso como meio de aceitação por parte de Deus é simplesmente anular a cruz de Jesus Cristo.
Igualmente importante e digno de nota é o fato de que nenhum pecado irá nos separar do amor de Deus, exceto o pecado de morte, isto é a blasfêmia contra o Espírito Santo de Deus7. Deus, muito antes e muito melhor que nós, sabe que somos pecadores. Os antigos cristãos até diziam: “Não somos pecadores porque pecamos, pecamos porque somos pecadores”. A raiz é que é a causa. Nossa raiz é pecadora. Nossa fonte é contaminada, por isso o fruto e a água que jorra são contaminadas. Porque somos Pecado, cometemos atos pecaminosos. Porque o pecado maculou nosso ser produzimos atos pecaminosos. Deus, no entanto, sabia disso antes de nos formar no ventre de nossa mãe; antes mesmo de escrever nosso nome no Livro da Vida antes de criar o universo; e enviou Cristo, seu Filho, para morrer por nós quando nós ainda éramos pecadores8. Cristo Jesus veio ao mundo para salvar pecadores. Então o pecado não é impeditivo para a Graça. Nesse sentido, a Graça de Deus é irresistível, pois “onde aumentou o pecado, aumentou muito mais ainda a Graça9. O poder do pecado é forte, mas a Graça de Jesus o supera. As promessas do pecado são atraentes sim, mas as promessas de Deus são excelentes e confiáveis. Como a Bíblia diz: “Tua Graça é melhor do que a vida”10. A Graça é a revelação de tudo aquilo que Jesus fez e de tudo aquilo que Jesus é para nós. A Bíblia diz que a Lei veio por Moisés, no entanto, a Graça e verdade vieram por meio de Jesus Cristo. A Graça que Jesus trouxe é tamanha que o evangelista pôde dizer: “Temos recebido de sua plenitude, graça sobre graça11”. É um exuberante receber da graça infinita de Deus.
Sendo melhor do que a vida, sendo maior que o pecado, sendo um dom exuberante de Deus para o seu povo, sendo a particularidade do Evangelho de Cristo, nada mais nos resta do que desejar arduamente a Graça de Deus e crescer mais e mais nela12, nada mais nos resta do que nos fortalecermos diariamente nela13, nada mais do que desfrutarmos dela. Se você ainda não a experimentou e a conheceu de modo pessoal, Deus lhe faz o convite hoje:
“Quem tiver sede, venha. Quem quiser, beba de graça da água da vida”14. Venha, vamos beber juntos dos rios caudalosos da Graça de Deus!
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1 2Timóteo 3:14-17
2 Josué 4:4-7; 7:26; 8:32; 24:26,27; Deuteronômio 4:9,23; 5:15; 7:18; 8:2-6; 9:7; 24:9; 32:7; 2Pedro 1:12-13; 3:1,2
3 YANCEY Philip Maravilhosa Graça trad. Yolanda, M. Krievin — 2ª Ed. rev. e amp. — São Paulo: Editora Vida, 2007, p. 40.
5 Tito 2:11-14
6 BERCOT DAVID, W. Que falem os primeiros cristãos: Uma análise da igreja moderna sob a luz do cristianismo primitivo, São Paulo, Monte Sião, 2003, p. 43.
7 1João 5:16; Marcos 3:28,29
8 Romanos 5:8
9 Romanos 5:20
10 Salmo 63:3
11 João 1:16
12 2Pedro 3:18
13 2Timóteo 2:1
14 Apocalipse 22:17
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